Brasil usará células-tronco de gordura da barriga em cirurgia cardíaca
Células-tronco extraídas de gordura da barriga serão usadas experimentalmente em cirurgias cardíacas com a intenção de recuperar o músculo do coração lesionado pelo infarto. A pesquisa, inédita no país, está sendo desenvolvida pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em parceria com o Instituto Ludwig, de São Paulo.
Experiências parecidas já são feitas no Brasil com células-tronco da medula óssea. A expectativa dos pesquisadores do Dante e do Ludwig é que a gordura forneça uma quantidade maior de células, o que, em tese, aumentaria as chances de sucesso do tratamento.
O tecido gorduroso, ricamente vascularizado, é fonte de células-tronco mesenquimais, capazes de se diferenciar em outros tipos de tecidos --como osso, cartilagens e células nervosas. Na pesquisa do Dante, a intenção é que elas induzam a criação de vasos sangüíneos e de novas células musculares cardíacas na região lesionada.
O estudo envolverá 200 pacientes entre 40 e 75 anos que necessitam passar por uma cirurgia de revascularização do músculo cardíaco (ponte de safena), em razão de lesões nas coronárias e de um enfraquecimento do músculo do coração.
Metade do grupo fará apenas a cirurgia tradicional e a outra metade receberá uma injeção de célula-tronco no músculo cardíaco. Por meio de uma cânula semelhante à usada na lipoaspiração, é feita a punção de 100 ml de gordura da barriga do paciente, como explica a cirurgiã plástica Isa Dietrich, pesquisadora do Instituto Ludwig que já desenvolveu na França uma pesquisa semelhante.
"A intenção é que essa célula-tronco se transforme em vasos sangüíneos e, principalmente, em células cardíacas, o que aumentaria a força do batimento na parede [do coração] que estava parada", diz o cardiologista Marcelo Sampaio, responsável pelo Laboratório de Biologia Molecular do Dante.
Para ele, a retirada de células-tronco do tecido adiposo humano tem vantagens. "É um processo simples e pode ser feito concomitantemente à cirurgia. Além disso, uma grande contingência de células-tronco emana dessa punção, muito mais do que da medula óssea."
Ele afirma que as pesquisas com células-tronco da medula óssea mostraram que elas não resultaram em grande quantidade de células de tecido muscular cardíaco. "Também houve muita perda de material. As células que se transformaram, um ano depois morriam."
InCor
O cardiologista José Eduardo Krieger, diretor do Laboratório de Genética e Cardiologia Molecular do InCor, rebate a afirmação explicando que a situação descrita por Sampaio se refere a experiências em que células-tronco da medula foram injetadas na corrente sangüínea, não no músculo cardíaco --como é o caso de um estudo desenvolvido no InCor. "Estamos testando a eficácia desse tratamento por meio de um estudo duplo-cego. Mas nem nós sabemos ainda o resultado."
O estudo faz parte de um dos braços da maior pesquisa clínica do mundo em terapia com célula-tronco, que o Brasil realiza há três anos. O trabalho avalia o impacto da utilização das células-tronco em quatro das principais doenças cardíacas: doença de Chagas, isquemia crônica, infarto e o "inchaço do coração" (cardiomiopatia dilatada). Os primeiros resultados saem em dezembro.
Krieger diz que o InCor também tem pesquisado células-tronco extraídas da gordura, em uma fase pré-clínica (com animais). "A gente tem que entender como essa célula pode dar origem a células da musculatura cardíaca, ou, o que é mais provável, como ela produzirá substâncias que vão estimular a formação de novos vasos [sangüíneos]. Precisamos conhecer demais o comportamento dessas células antes de passar para [experiências com] humanos."
Marcelo Sampaio diz que não há riscos para o paciente. "São células do própria pessoa, não há problema de rejeição."
Segundo o médico, hoje, os resultados da cirurgia de ponte de safena são muitos bons em relação à restauração do fluxo sangüíneo no coração e ao alívio de sintomas.
O problema tem sido a recuperação do músculo necrosado, que leva ao desenvolvimento da insuficiência cardíaca. "Os pacientes ficam seqüelados. Há estudos que mostram que os pacientes já não morrem tanto por infarto, mas por complicações da insuficiência cardíaca."
A previsão é de que, em seis meses, sejam obtidos os primeiros resultados do estudo, que deve seguir por dois anos.
Fonte: 24HorasNews